Os militares assumiram o poder depois de alegarem "irregularidades" nas eleições de 8 de novembro de 2020, nas quais o partido Liga Nacional para a Democracia conseguiu vencer com maioria absoluta. Já morreram mais de mil civis às mãos do exército.
Foi na véspera da tomada de posse dos órgãos de governo, a 31 de janeiro de 2021, que o exército birmanês deteve a líder da Liga Nacional para a Democracia (NLD), Aaung San Suu Kyi, assim como outras personalidades do partido como o Presidente, Win Myint. O exército havia negado estar a preparar um golpe militar numa publicação no Facebook.
O golpe de estado foi imediatamente criticado pela Organização das Nações Unidas, a União Europeia, Estados Unidos e outras entidades internacionais. A alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, declarou aos militares: "Recordo à liderança militar que a Birmânia [antigo nome de Myanmar] está sujeita ao direito internacional dos direitos humanos, incluindo o respeito pelo direito de reunião, e que deve abster-se de usar força desnecessária".
Aquando do golpe de estado, o Supremo Tribunal estava a avaliar as queixas apresentadas pelo Partido da Solidariedade e do Desenvolvimento da União (USDP) acerca das alegadas irregularidades ocorridas durante as eleições. No entanto, os militares não esperaram pela decisão judicial. Os militares garantiram que o golpe se tratava apenas de um período de transição e prometeram eleições ao final do mesmo.
O Tatmadaw - nome dado ao exército - nunca deixou o poder na totalidade, mesmo depois da instauração da democracia. A Constituição de 2008, redigida por militares, dá-lhes a garantia de 25% dos lugares no Parlamento e as pastas da Defesa, Fronteiras e Interior para as suas chefias. O chefe militar de Myanmar, Min Aung Hlaing, comanda o exército desde 2011. Aung Hlaing já foi alvo de sanções pelos EUA, por perseguição aos muçulmanos rohingyas.
Na sequência das primeiras detenções de pessoas relacionadas com o NLD, o porta-voz Myo Nyunt, em declarações à Reuters, afirmou estar também à espera de ser detido, mas pediu ao povo "para não responder precipitadamente e [para atuarem] de acordo com a lei". Suu Kyi, em comunicado, pediu ao povo birmanês, por outro lado, para "protestar com toda a sua força".
O que se seguiram, foram dias de manifestações gigantes contra o golpe militar em Rangum, a maior cidade de Myanmar, assim como em outras cidades. Os confrontos entre os populares e a polícia foram-se multiplicando, e nem a declaração de lei marcial em diferentes zonas de Rangum travou as manifestações e os ajuntamentos de cidadãos. Os protestos de desobediência civil contaram ainda com estudantes e professores, advogados, funcionários públicos, monges e médicos que declararam não trabalhar ao serviço dos generais. Os manifestantes adotaram a saudação dos três dedos do filme Hunger Games como gesto de protesto.
"Digam ao mundo o que está a acontecer aqui" - manifestante em declarações ao The Guardian
A 6 de fevereiro o acesso à internet foi bloqueado no país, de forma a tentar travar a vaga de protestos e contestação que assolavam a nação. Prontamente, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos pronunciou-se publicamente em relação ao bloqueio de comunicações, afirmando que a ligação à internet teria de ser reestabelecida para "garantir a liberdade de expressão e o cesso à informação".
Apesar da resistência da população, os militares ameaçaram os trabalhadores com consequências, caso estes não voltassem a exercer as suas funções com normalidade. O exército acabou por começar a deter pessoas e a realizar buscas em propriedades privadas sem autorização por parte judicial.
Ao longo dos meses que se seguiram, os conflitos nunca cessaram e mais de um milhar de civis acabaram por ser mortos às mãos do exército.
A 27 de outubro, Aung San Suu Kyi depôs em tribunal pela primeira vez desde a sua detenção. Suu Kyi estava acusada de incitamento à perturbação da ordem pública, e violação de restrições relacionadas com a covid-19, entre outros crimes. A junta militar proibiu a equipa legal de Suu Kyi de prestar qualquer tipo de declarações à imprensa acerca das audiências.
O último mês
Na sequência do assassinato de cerca de 30 pessoas em Hpruso, no estado de Kayah - cujos corpos foram consequentemente queimados pelo exército - a União Europeia afirmou estar preparada para impor sanções a Myanmar e apelou à Comunidade Internacional para fazer um embargo ao fornecimento de armas para o país.
Josep Borrel, Alto Representante para a Política Externa e de Segurança da União Europeia, no seu Twitter, condenou "a violência e as atrocidades" praticadas pelos militares e afirmou que "os responsáveis têm de ser responsabilizados".
Todos os apoios da UE para o Governo de Myanmar já foram suspensos.
コメント