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  • Foto do escritorFernando Costa

Uma tempestade política chamada Açores

O Orçamento dos Açores foi aprovado a 25 de novembro com votos a favor do PSD, CDS-PP, PPM, Chega, IL e o deputado independente Carlos Furtado. No entanto, o panorama político da região caracteriza-se, desde as eleições regionais de 2020 por um clima de tensão e incerteza constante.


Foto retirada da página de Facebook oficial de José Manuel Bolieiro

A proposta do decreto legislativo do Orçamento da Região Autónoma dos Açores para 2022 foi aprovada na generalidade. Ao final da renhida votação, os 29 votos a favor do decreto vieram da coligação entre o PSD, o CDS e o PPM - na chamada reedição da Aliança Democrática (AD) de 1979 - e dos três deputados de direita eleitos para a assembleia da Região autónoma - um do Chega, um da Iniciativa Liberal (IL) e Carlos Furtado (ex-Chega). Contaram-se 28 votos contra, dos deputados do PS, dos dois deputados do Bloco de Esquerda e do deputado único do PAN.


No entanto, com um executivo de direita a depender de uma coligação frágil e de parceiros imprevisíveis, o panorama de governação da região autónoma dos Açores é fértil em polémicas. Todo o período desde as eleições dos Açores em outubro de 2020, até à votação do Orçamento para 2022 em novembro ficou pautado por um clima político incerto de negociações, avanços e recuos.


O parto complicado da Geringonça à direita


A 25 de outubro de 2020, nas eleições nos Açores, o Partido Socialista conquistava uma vitória com sabor a derrota. Com 39,1% dos votos, o PS via-se a eleger 25 deputados, o que significava que perdia 5 e, com eles, a maioria absoluta para a governação. Em cadência inversa, o PSD conseguia somar mais 2 deputados aos que tinha anteriormente, totalizando 21.


Perante a ausência da maioria absoluta por parte do PS, começou a ganhar forma a possibilidade de se construir, à semelhança do que acontecera nas Legislativas de 2015, uma Geringonça para os Açores. A grande diferença seria que, desta vez, o acordo se daria entre os partidos da direita. Prontamente o PSD, o CDS e o PPM anunciaram a oficialização de um "acordo de governação". Desta forma, somavam-se aos 21 deputados do PSD, 3 deputados eleitos do CDS-PP e 2 do PPM. Com um total de 26 deputados, faltariam ainda três para conseguir a maioria.


Assim, tendo em conta que o deputado da IL afirmou não se querer comprometer com coligações, começaram negociações entre a nova AD, o Chega e o PAN.


No entanto, o que começou como um processo negocial sobre o futuro dos Açores, rapidamente se alastrou ao grande plano político nacional. André Ventura, o líder do Chega, desafiou Rui Rio a debater a sua proposta de revisão constitucional, em troca do apoio do Chega para a governação nos Açores. Rui Rio recusou estar de acordo com a mesma revisão da Constituição, acrescentando: "eu tenho bom feitio, mas isso é quase insultuoso".


Foto: Partido Social Democrata / Flickr

A 2 de novembro, apesar das divergências entre Rio e Ventura, Carlos Furtado - na altura ainda do Chega Açores - confirmava o apoio do partido para a governação à direita do arquipélago. Em paralelo, surgiam conflitos internos no Chega que culminariam na demissão de Orlando Lima, vice-presidente do Chega Açores.


Apenas 3 dias depois, André Ventura assegurava que tinha suspendido as negociações com o PSD e que daria indicações aos dois deputados do partido para não viabilizarem um Governo nos Açores. Fosse à direita, ou à esquerda. Em Assembleia, Ventura declarou que o seu partido era só um, independentemente da região e que não deveria ser "diabolizado". "Habituem-se. Nós não somos o CDS" afirmou.


“O Chega não pode ser o diabo nacional, e valer nos Açores e não valer nada na Madeira” - André Ventura

O presidente do Chega referiu ainda que estaria disponível para eleições antecipadas na região, acrescentando que tal facto poderia até ser positivo para o partido que quase elegera um terceiro deputado nas eleições dos Açores em outubro.


No dia seguinte, em mais uma reviravolta, o Chega anunciou viabilizar o Governo à direita dos Açores. André Ventura afirmou que o acordo se dava por cedências de ambas as partes. Enquanto o Chega recuou na exigência que tinha feito ao PSD para a revisão constitucional que incluía a proposta de castração química, segundo Ventura, o PSD apresentaria propostas de revisão constitucional para a redução do número de deputados no Parlamentos dos Açores e na Assembleia da República.


André Coelho Lima, vice-presidente do PSD, no entanto, afirmou que não havia nenhum acordo com o Chega nem "qualquer moeda de troca com a revisão constitucional". Segundo Coelho Lima, a verdade é que teria "havido a transmissão ao partido Chega de alguns dos princípios que poderão integrar um projeto de revisão constitucional do PSD. A medida em que esses princípios mereçam a concordância do Chega é, naturalmente com o Chega".


Apesar das afirmações do vice-presidente social democrata, os partidos de esquerda não tardaram: Pedro Filipe Soares do Bloco de Esquerda afirmou que "A construção de um governo regional feita em cima de uma cedência à extrema-direita é a normalização para a democracia precisamente dos partidos que a querem destruir". O então líder do PAN, André Silva, declarou também que o seu partido não viabilizaria um "governo que dependa de um partido que é do campo não democrático".


Apesar do clima tumultuoso, a 11 de dezembro de 2020 o programa do XIII Governo dos Açores acabou por ser aprovado com 29 votos a favor - PSD/CDS-PP/PPM, Chega e IL.


A 23 de abril também o Orçamento dos Açores para 2021 foi aprovado, com os mesmos votos a favor e a abstenção por parte do PAN, apesar de André Ventura ter ameaçado quebrar o acordo governativo devido à forma como se havia discutido o Orçamento.


Os problemas na gestão das verbas do PRR


Apesar de ter tido um parto complicado, com um ano de existência o governo dos Açores parecia mostrar sinais de estabilidade. A carga fiscal baixou o máximo possível, mais de 280 professores foram integrados nos quadros e criou-se um teto para o preço das viagens entre ilhas dos Açores. No entanto, foi a polémica da gestão das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) voltaram a atirar o governo açoriano para o centro do furacão.


No âmbito das agendas mobilizadoras do PRR, previa-se que 117 milhões de euros seriam direcionados para as empresas açorianas. O governo açoriano influenciou o processo através da contratação de duas auditoras - KPMG e Deloitte - e, da definição das áreas para as quais se criariam agendas - agro-indústria, economia do mar e turismo - em conjunto com as Câmaras do Comércio.


A influência por parte do executivo açoriano fez com que as reações se multiplicassem, quer por parte de empresas privadas que o acusavam de beneficiar certas empresas em vez de outras, quer por parte dos partidos.


O governo açoriano justificou as suas ações com a inatividade e a falta de iniciativa por parte dos empresários da região e o risco de perder o dinheiro proveniente do PRR. O secretário regional das Finanças, Joaquim Bastos e Silva sublinhou que o "governo não selecionou empresas" e que tudo se tratou de "uma corrida contra o tempo" - tendo em conta que o prazo de apresentação das candidaturas terminava a 30 de setembro. Acrescentou também ser "preferível ser escrutinado pela ação do que ser julgado por nada fazer". Bastos e Silva reconheceu, no entanto, problemas ao nível comunicacional por parte do executivo.


"O que está aqui em causa é mais uma vez um mau relacionamento que este governo tem com a transparência" - Vasco Cordeiro, líder parlamentar do PS-Açores

Vasco Cordeiro | Foto: European Union/ Patrick Mascart / Philippe Buisson

O líder do executivo açoriano, José Manuel Bolieiro acabou por anunciar uma repetição do processo da Agendas já que, nas suas palavras "quem não deve não teme".


O caos provocado levou a que a Iniciativa Liberal ameaçasse votar contra o Orçamento para 2022. Nem o parceiro da coligação, CDS-PP, poupou críticas ao PSD afirmando que "não será inocente a atribuição dessas agendas mobilizadoras a apenas dois ou três grandes grupos económicos".


Depois de também Pedro Neves, do PAN, assegurar que não apoiaria futuramente o governo dos Açores, e tendo em conta as crises internas do Chega - o partido perdera um deputado quando Ventura retirou a confiança política a Carlos Furtado, ex-líder do Chega Açores, que passou assim a deputado não-inscrito - a aprovação do Orçamento para 2022 tornou-se uma incerteza.


A aprovação do Orçamento


A utilização do governo regional dos Açores como arma de arremesso entre o Chega e o PSD tornou-se prática comum desde as eleições de 2020. Em vésperas de votação do Orçamento regional para 2022, Rio afirmou numa entrevista à Antena 1 que viabilizaria um governo do PS, caso um Governo do PSD dependesse do Chega para singrar.



Prontamente, André Ventura afirmou cessar o apoio à governação do executivo açoriano caso Rio viabilizasse, de facto, um governo do PS.


Antes da votação para o Orçamento, a Direção Nacional do Chega acabou mesmo por retirar o apoio ao Governo Regional devido "ao desrespeito com que o PSD tem tratado o Chega a nível nacional e regional". José Pacheco, o deputado único do Chega nos Açores afirmara então que votaria contra o Orçamento caso não se verificasse uma mudança de atitude por parte do PSD. No entanto, e contra a Direção Nacional do seu partido, o deputado assegurou que estava ainda disponível para negociar com o Governo Regional e que a "última palavra" seria sua.


Também o deputado da IL, Nuno Barata, ameaçara chumbar o Orçamento caso não se previsse uma redução de "15 a 20 milhões de euros" no endividamento da região.


No final de contas, ambos os deputados - do Chega e do IL - acabaram por votar favoravelmente o Orçamento, tal como o ex-líder do Chega Açores - e agora deputado não-inscrito - Carlos Furtado. O Orçamento dos Açores para 2022 acabou então por ser aprovado na Generalidade.

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