O webinar que marcou o lançamento do Thinking Football Summit 2022 teve lugar esta segunda-feira e contou com três painéis de oradores que debateram assuntos como o futuro do futebol mundial, a superliga europeia e a necessidade de uma "cultura de integridade" na modalidade.
Desigualdade entre ligas, a venda centralizada dos direitos audiovisuais, a sobreposição dos interesses económicos aos interesses desportivos e a crise reputacional do futebol enquanto modalidade. Os temas estiveram em destaque, esta segunda-feira, em mais um webinar “Thinking Football” organizado pela Liga Portugal.
O evento online marcou o lançamento da “Thinking Football Summit 2022”, uma conferência internacional que vai decorrer na Super Bock Arena – Pavilhão Rosa Mota, no Porto, entre os dias 18 e 20 de novembro do próximo ano.
O objetivo da cimeira organizada pela Liga Portugal é proporcionar “debates em torno das grandes temáticas deste desporto” e explorar “a vertente empresarial e de negócio do futebol”. O pré-evento que decorreu no início desta semana teve também esse propósito nos três painéis que reuniu.
O jornalista e comentador desportivo Nuno Dias moderou as sessões que contaram, entre os oradores, com o presidente da Liga Portugal, Pedro Proença e o presidente da La Liga, Javier Tebas, e de especialistas de áreas relacionadas com o desporto-rei, como Daniel Sá, do IPAM, e Eduardo Medeiros da SIGA – Sport Integrity Global Alliance, entre outros.
O presente e futuro do futebol mundial e a ameaça da superliga
O primeiro debate reuniu o presidente da Liga Portugal, Pedro Proença, e o presidente da Liga espanhola, Javier Tebas. Discutiu-se a hegemonia das principais ligas europeias e formas através das quais ligas pequenas ou médias (como a portuguesa, sexta no ranking de ligas europeias) poderiam aumentar a sua competitividade internacional.
Para Javier Tebas, em algumas ligas, são sempre as mesmas equipas a representar o país nas competições internacionais, o que aumenta cada vez mais o fosso económico entre clubes e se repercute na diminuição da competitividade interna. Abordando a diferença em poder económico entre a liga portuguesa e as “Big 5” – ligas inglesa, espanhola, italiana, francesa e alemã – o presidente da La Liga apontou a venda centralizada dos direitos audiovisuais como um meio essencial para equiparar a Liga Portugal às restantes.
Em concordância, Pedro Proença considerou ser esta a “chave do sucesso” e afirmou que o decreto-lei que prevê a venda dos direitos audiovisuais pela Liga é “a grande medida dos últimos 20 anos”. O presidente da liga portuguesa apontou o ano 2027/28 como meta para a centralização dos direitos televisivos.
Em seguida, foi abordado o tema da polémica superliga europeia. Os presidentes das duas ligas concordam que esta competição levanta questões éticas importantes, dado que os grandes clubes, por lucrarem muito mais, acabariam por dominar o mundo do futebol.
O presidente da La Liga reforçou que deve priorizar-se o investimento em ligas pequenas, nas quais os profissionais não têm condições laborais, ao invés de distribuir o dinheiro pelos clubes mais ricos. Pedro Proença acrescentou que em nenhuma circunstância as condições económico-financeiras se devem sobrepor ao princípio do mérito desportivo – usando o título europeu do FC Porto como exemplo – e que é “necessário um futebol solidário e onde todos possam ter acesso”.
Calendários internacionais
O painel de oradores do segundo debate foi composto por Pedro Martins, treinador do Olympiacos FC, Marcos Senna, ex-futebolista e embaixador da La Liga e Daniel Sá, diretor executivo do Instituto Português de Administração e Marketing (IPAM).
Para Pedro Martins, a crescente quantidade de jogos em curtos períodos de tempo que se tem verificado advém da prioridade dada a aspetos financeiros em detrimento do respeito pela saúde dos profissionais e pelo futebol. O treinador afirmou que a redução dos tempos de recuperação dos jogadores se reflete num aumento da frequência de lesões e na diminuição da qualidade de jogo.
Daniel Sá acrescentou que a situação é também responsabilidade dos stakeholders da indústria futebolística, que lucram com a grande quantidade de jogos atual. No entanto, alertou para o facto de se estar a assistir a uma “overdose” de futebol semanal que pode provocar cansaço nos espectadores, afastar o público e, consequentemente, patrocinadores.
Sobre a possibilidade de se vir a ter em conta a opinião dos treinadores e dos jogadores na organização do calendário de jogos, Pedro Martins afirmou ser culturalmente muito difícil atingir este ponto de concordância nos próximos tempos.
Como reforçar a integridade do futebol?
O último debate do webinar debruçou-se sobre os problemas de integridade do futebol e contou com a presença de Emanuel Medeiros, Global CEO da SIGA, o professor universitário Miguel Poiares Maduro e o membro do comité executivo da Allianz, José Francisco Neves.
Emanuel Medeiros abriu a discussão afirmando que o “quadro de profunda crise” que se vive no panorama futebolístico deve-se não só à pandemia da covid-19 e aos problemas económicos que provocou, mas também ao facto de o desporto ainda não ter recuperado do ponto de vista reputacional de escândalos como o Fifagate de 2015.
Na mesma linha, Miguel Poiares Maduro afirmou que os casos de corrupção têm sido mais frequentes nos últimos tempos e que o ambiente de impunidade que se cria torna difícil desenvolverem-se investigações robustas. A concentração de poderes e a pouca independência dos órgãos de fiscalização existentes foram também apontados como fatores que diminuem o escrutínio.
José Francisco Neves, referindo-se às parcerias entre patrocinadores e futebol, sublinhou que a paixão ainda traz valor positivo às marcas, mas alertou que quando a discussão acerca do valor reputacional do futebol se tornar mais racional, a modalidade desportiva pode perder muito.
No final da discussão, em relação às soluções apontadas para o problema da reputação negativa do futebol, todos os oradores concordaram ser imperativo impor uma cultura de integridade no desporto e reforçar o papel das entidades reguladoras de forma a mitigar o dano reputacional.
Artigo publicado originalmente no jornal online JPN
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